Please activate JavaScript!
Please install Adobe Flash Player, click here for download

bualRevisitado110414

6 Bual citando Bual, “são símbolos de humanidade e despojamento, de torturas e amor, na aventura da existência”. Diríamos que o tema religioso – a “transcendência”, como Bual gostava de dizer - esteve sempre presente. Num texto publicado em 1964, Bual pensava na sua própria pintura como algo que o transporta “com a insatisfação do humano em busca do transcendente”. Era levado pelas mãos “crispadas na amurada incerteza” das suas incertezas, acrescentava, “trincando palavras sem forma concreta que segredam o grito, para além da policromia clássica e para aquém da minha causa, de captação do absoluto” (). Numa interpretação dramaticamente pessoal, Bual acrescentaria mais tarde: “Cristo é talvez um homem transfigurado, pinto-o no sentido de ter sido, quanto a mim, um dos grandes poetas... Alguém que deu e ainda dá!” Estou sempre predisposto a pintá-lo. Quem sabe se não o pinto como quem faz um auto-retrato?” Num olhar especulativo, as designadas «cabeças» de Cristo permitem uma leitura ambígua. Na expressão de sofrimento e no rasto do traço sanguíneo, dão-nos também a ideia de um «corte». Só um estudo aprofundado das confessadas e, por isso, insondáveis motivações do pintor, permitiria averiguar a plausibilidade desta intuição interpretativa. Para um artista cuja técnica e contexto se revelam impulsivos, não é de excluir a hipótese de uma manifestação do simbólico metafórico, de uma linguagem subliminar num tema tão intrigante. Eduardo Nascimento, artista plástico e dinamizador do Círculo Cultural e Artístico Artur Bual, enquadra esta leitura numa simbologia de rutura. As «cabeças» de Cristo são “como um corte que remete para a solidão”, como um “isolamento” imposto por uma paradoxal necessidade do íntimo, “é a tentativa de ir mais além na dupla relação que temos connosco, a eterna solidão para nos aproximarmos da «simples» pergunta: «Quem sou eu?»”. Uma leitura em sintonia com o já citado desabafo do artista, quando assume que pode ter pintado Cristo “como quem faz um auto-retrato”. O “transcendentemente vagabundo” Bual, nas palavras de Eduardo Nascimento, “colocava na tela essa verdade simples (…) que se ocupa e afaga nos vários momentos que os ventos mudam na nossa rota, (…) despejando a força do maior maremoto ou turbulência”, como se tudo se inclinasse “para a libertação e conclusão do caos, da utopia no tempo inexistente dessa verdade”. Bual pintava os Cristos em silêncio, lembra Nascimento, “o silêncio transcendente da intemporalidade de uma montanha, numa cave que por vezes tinha a sensação do poder absoluto de um Deus, num deserto, esperando uma mão cheia de gotas de água, para mostrar as flores mais belas no efémero de um belo somente acessível ao olho interno da procura da luz”. “Com estes rostos e as crucificações de Cristo, ficamos serenos e inquietos”, disse o padre Vítor Melícias na abertura de uma exposição de 26 quadros de Artur Bual na Igreja Matriz da Amadora, em outubro de 200. Bual vivia e tinha o ateliê numa cave localizada nas imediações. Houve reação na cidade, no meio cultural e eclesial. As pinturas foram expostas na nave da igreja e no deambulatório. Podiam ser vistas enquanto o templo estava aberto, sem restrições ou pagamento. Durante dois meses, as celebrações religiosas tiveram a presença dos Cristos de Bual - «cabeças», «crucificação» e «ceia». À paróquia chegaram opiniões diversas. Houve clérigos que criticaram a iniciativa, não tantos quantos os que a elogiaram. Meses depois, a iniciativa seria replicada em Braga, mas na Sala do Recibo do Mosteiro de Tibães, associada às iniciativas de caráter cultural da Semana Santa bracarense. “A crítica cultural purifica a religião de andrajos que lhe retiram a luz pura e nua de Deus”, disse a

Sítio